Terra Forte segue a história de uma família açoriana que, há séculos, deixou o arquipélago em busca de uma vida melhor no Brasil. Foi em terras distantes, em Florianópolis, que encontrou oportunidade, prosperou e criou o que hoje se tornou um império de pesca - a Açoreana - motivo de grandes disputas na trama.

Tudo começou com o pouco que tinham: o conhecimento das antigas técnicas de pesca artesanal dos Açores. Aplicadas ali, mudaram o destino daquela família e, de certa forma, também o da comunidade que os recebeu.

Curiosamente, Terra Forte estreia num momento em que Portugal atravessa um dos maiores desafios da sua história recente: repensar as suas políticas migratórias e a forma como acolhe quem chega em busca de um futuro melhor. Entre eles, muitos brasileiros: a comunidade estrangeira mais expressiva do país.

Temos assistido a episódios de intolerância e desconfiança, sobretudo nas cidades onde essa presença é mais sentida. É impossível fingir que o clima não mudou. Portugal enfrenta pressões reais, e é natural que surjam incertezas e até resistências. Mas a solução não pode ser o radicalismo, nem a perda da memória.

Porque fomos, e continuamos a ser, um povo de emigrantes. Espalhámo-nos pelo mundo com coragem, deixando raízes em quase todos os continentes. Quando os primeiros seis mil açorianos chegaram a Florianópolis, havia ali pouco mais de cinco mil habitantes locais. O Brasil recebeu-os, integrou-os e fez deles parte da sua identidade.

Também nós, quando partimos, não levámos só sonhos: levámos condenados, levámos o nosso passado mais duro, e o Brasil transformou tudo isso em futuro. É essa capacidade de converter dor em vida que faz do povo brasileiro algo tão próximo de nós, e talvez tão nosso também.

Claro que, como em qualquer movimento de migração, há histórias diferentes. Há quem venha para construir, e há quem traga consigo caminhos tortos que exigem resposta firme da lei. É assim em todos os povos, em todas as épocas. O importante é saber distinguir: combater o crime sem criminalizar a esperança; punir quem fere a sociedade, mas proteger quem a faz crescer.

Hoje, quem visita Florianópolis ouve, com orgulho, pessoas dizerem “sou açoriana”, mesmo dez gerações depois. Tal como no Rio, muitos dizem “sou descendente de portugueses”. Essa herança lembra-nos da força que há em reconhecer o outro como espelho.

O Brasil mudou com a presença portuguesa, e nós também mudamos com a presença brasileira. Talvez o segredo esteja em aceitar esse reflexo e perceber que, mais do que diferenças, há uma história partilhada.

Alguém escreveu um dia que os brasileiros são portugueses à solta. Eu acrescentaria: em cada brasileiro há um pouco de Portugal. E é por isso que rejeitar um é, de certa forma, rejeitar uma parte de nós mesmos.

Terra Forte nasce com o desejo de relembrar aos portugueses que sempre fomos um país de partidas e reencontros. Que quase todas as famílias têm alguém que um dia foi procurar longe o que não encontrou aqui. Que possamos, nesta novela, olhar para essas viagens - antigas e novas - com empatia.

E talvez perceber que, mesmo em tempos difíceis, dar a mão é sempre o primeiro passo para reconstruir uma terra verdadeiramente forte.