Já tinha pensado o que faria se o desafiassem a fazer uma novela. Amigo de Aldo Lima e fã de Roberto Pereira, Nilton decidiu avançar para um projeto na sua área, o humor, mas que o coloca fora da sua zona de conforto. O resultado é uma “experiência muito boa”.

 

MC News: Escreveu no seu Instagram que várias vezes pensou no que responderia se o convidassem a fazer uma novela. Desta vez o pensamento tornou-se real. O que o levou a aceitar fazer este papel em “Festa é Festa”?

Nilton: Em primeiro lugar porque estou com mais tempo para o fazer, numa altura de pandemia em que há menos espetáculos e tudo está mais parado. E depois o facto de o Aldo [Lima] estar na novela também pesou muito - é o meu melhor amigo no humor, é uma pessoa de quem gosto muito. Na semana anterior tinha estado a almoçar com ele, falou da novela, disse que estava a ser giro. Quando me ligam obviamente achei graça. Porque não experimentar, visto que tenho o devido respeito e distanciamento do trabalho de ator? Ou seja, não sou ator, sou um indivíduo que faz umas personagens, faz umas brincadeiras, mas não me considero um ator e respeito muito os atores. Por outro lado, o facto de me convidarem como Nilton, para fazer de Nilton, obviamente ajuda. Não vou ter que sair desse personagem que sou eu.

MC News: Ser uma novela humorística teve influência? Ou se fosse uma novela tradicional também admitiria a possibilidade de participar?

Nilton: Sim, desde que não me fizesse sair excessivamente da minha zona de conforto. Na “Festa é Festa” sinto-me mais feliz por ser uma novela de humor, ela própria já é desconstruída. O facto de eu estar a fazer de mim próprio, embora esteja mascarado de padre penteado com risco ao meio, tudo isso já é uma desconstrução total e obviamente alivia a carga que possa haver – e há sempre carga, há uma equipa à tua volta e tens uma responsabilidade que não passa ao lado.

MC News: Sente-se confortável porque está a fazer de Nilton, mas é um duplo desafio: o Nilton não é o Nilton – está a seguir um guião – e faz de ator que representa um papel.

Nilton: Na verdade é um bocadinho como o filme “Inception”, é uma novela dentro da própria novela. É um pouco “Twilight Zone”, mas esse lado nonsense também lhe dá muita graça.

MC News: Imaginava-se a fazer o papel de si próprio que por sua vez faz o papel de um padre?

Nilton: Há ali duas pessoas de quem eu gosto muito: o Roberto Pereira, o autor, e o Carlos M. Cunha, cuja personagem eu estou a dobrar, e de quem sou fã há muitos anos.  Ainda por cima – e essa desconstrução já tinha sido utilizada na novela, com o Manuel Marques e o Paulo Pires - o Carlos tem quase o dobro da minha altura, tem alguma graça eu estar a encarnar o papel de uma pessoa que fisicamente se calhar não tem tanto a ver comigo. Pronto, em comum temos óculos e a barba por fazer (risos).

MC News: Já escreveu que gostou de se ver do tamanho do Paulo Pires, numa imagem de promoção da novela (risos). E ver-se de risco ao meio e de batina?

Nilton: Há um clichê na sociedade em que os padres têm todos que falar assim [Nilton fala com sotaque], vêm de Viseu, e têm quase risco ao meio ou um penteado muito esquisito. O Carlos M. Cunha consegue desconstruir essa imagem, porque tem o cabelo dele, normal, e não fala à moda de Viseu. Conseguiu fazer muito pelo penteado dos padres e de repente vem o Nilton e estraga tudo outra vez (risos). Sendo que o penteado não é culpa minha e ainda por cima abusam do meu cabelo – podiam pôr-me uma peruca! (risos). Pode é haver o risco é de eu gostar e passar a andar assim (risos).

MC News: Como espectador já tinha visto ou já tinha tido interesse pela novela “Festa é Festa”?

Nilton: Como humorista tenho curiosidade em ver coisas novas, o que está a passar, o que se está a fazer. Como já disse sou fã do Roberto Pereira, sigo-o nas redes sociais e é natural ver a “Festa é Festa”, ver o trabalho que está a ser feito. Não sigo regularmente porque tenho dois filhos pequenos e estou a adormecê-los à hora da novela. Por exemplo ontem foi a minha mulher adormecê-los, liguei a televisão e apanhei ainda um bom bocado do episódio. Trabalho demasiado e acabo por não ter muito tempo livre, mas sou atento e vou vendo o que se passa.

MC News: Como vê o papel do humor numa novela? Acha que esta ideia foi um ‘ovo de colombo’ e que é estranho ainda não ter sido feito em Portugal?

Nilton: A Globo fazia isto há muitos anos, por exemplo a novela “Araponga”, mas eram sempre relegadas para a hora do almoço. As novelas mais humorísticas eram uma tradição de hora de almoço, nunca assim em prime-time, à noite. O humor sempre foi um bocadinho um parceiro pobre, tal como no cinema. Felizmente estive em vários projetos de humor em Portugal, o caso do “Levanta-te e Ri” ou o “Cinco Para a Meia-noite”, projetos que marcaram tanto a sociedade, que marcaram gerações, e depois de repente vivemos num marasmo esquisito em que quase não há programas de humor na televisão. Tudo o que seja humor, mais popular ou menos popular, é sempre bem-vindo. Ainda por cima este é um projeto de humor que é líder, vence quase sempre nas audiências. Na verdade, estamos só a comprovar que o humor vende e que tem sucesso.

As novelas mais humorísticas eram uma tradição de hora de almoço, nunca assim em prime-time, à noite. O humor sempre foi um bocadinho um parceiro pobre, tal como no cinema.

MC News: Está a gostar de fazer esta novela?

Nilton: Ainda só gravei duas vezes, mas sim está a ser muito giro: pela experiência e por um lado que infelizmente não aparece lá em casa que é a galhofa à volta das gravações. Quando fui ao estúdio e à aldeia, o que senti é que tem muito boa onda, é raro haver projetos com esse desprendimento. Está tudo muito divertido, está tudo muito bem-disposto, sempre que entra a Ana Guiomar há uma festa muito grande. O Pedro Teixeira também sempre na galhofa, o Pedro Alves. Há ali uma boa onda muito grande e ainda para mais eu estando com o Aldo - temos anos e anos de estrada, anos e anos de espetáculos juntos em que temos uma cumplicidade muito grande - acabo por estar em casa. Não é o teu metier, estás ali como peixe fora de água, mas sentes-te acarinhado pelas pessoas à tua volta e, claramente, em casa.

MC News: Diz que está fora da zona de conforto, mas o seu humor é muito feito de personagens.

Nilton: Sim. Gosto de improvisar, na primeira cena em que apareço o padre fala comigo e eu improviso. A novela permite isso e aí estou no meu métier, mas para todos os efeitos estou fora da zona de conforto. Em quase todos os programas onde estive era eu o the man, com um guião meu e a controlar tudo. Aqui tu és uma peçazinha num puzzle muito grande, mas essa experiência é muito boa.