O jornalista Miguel Fernandes conduz a série de 12 reportagens “No Limite”, um trabalho em que concilia a vertente profissional com o seu gosto pessoal pelo desporto de aventura. O resultado são reportagens em que as emoções não são escondidas. Como diz o próprio, com este programa percebe-se que “é muito bom vivermos a vida no limite” e ele pode ser “um momento emocional, pode ser um momento físico, pode ser um momento coletivo ou até unipessoal”.

 

MC News: Como surgiu a ideia de fazer esta série de reportagens “No Limite”?

Miguel Fernandes: Gosto de deportos de aventura, de experiências com intensidade, e a direção de informação da TVI, que sabe que tenho um estilo de reportagem muito próprio, desafiou-me a juntar essas características de repórter com este meu gosto pessoal pelo desporto de aventura. Dá-me um prazer gigantesco conciliar a minha vida e o meu trabalho.

MC News: O Miguel é muito genuíno nas suas reações.

Miguel Fernandes: Uma das características destas reportagens é a transparência emocional. Na primeira, na experiência de espeleologia, a certa altura estava muito nervoso, as interjeições que usei não eram de pura alegria, eram de nervosismo também. Nunca tinha estado numa situação daquelas, nem suspeitava que iria estar num sítio tão apertado, achava que íamos andar sempre em pé…

MC News: É quase como uma reportagem em direto, de alguma forma.

Miguel Fernandes: Sim, o objetivo é conseguirmos transmitir muita realidade e muito realismo emotivo. Não só emoções minhas, como também do repórter de imagem e das pessoas que estão ali connosco. Nunca pedimos, por exemplo, que as pessoas voltem atrás, que repitam movimentos. As reportagens têm de ser realistas: se no momento me der vontade de rir, eu vou rir, se me der vontade de comentar ou brincar, vou fazê-lo, se tiver medo não vou condicionar, se acontecer algo de que não estava à espera, vai com certeza aparecer. O objetivo é passar a mensagem de que é muito bom vivermos a vida no limite, mas o limite não tem de ser uma coisa física, impossível ou perigosa. O limite pode ser um momento emocional, pode ser um momento físico, pode ser um momento coletivo ou até unipessoal, uma experiência que estou a viver de forma diferente das pessoas que estão ao meu lado.

MC News: Como é que o repórter de imagem filma em sítios difíceis como algumas passagens da gruta ou mesmo na subida do Pico

Miguel Fernandes: Em geral não usamos câmaras convencionais de reportagem. Usamos câmaras pequenas como as GoPro e, em grande parte do que temos filmado, telemóveis de última geração. Este tipo de telemóveis é muito útil nestas situações porque são pequenos, leves, permitem mais facilmente captar emoções. Não temos de ligar a câmara, posicioná-la. O telemóvel é mais fácil de movimentar e, através dele, muito rapidamente conseguimos apanhar o momento real. Normalmente usamos o telemóvel ou a GoPro na mão, para ter mais capacidade de movimentos e filmar momentos impactantes.

MC News: O repórter de imagem subiu a ilha do Pico com um telemóvel na mão?

Miguel Fernandes: Na reportagem do Pico eu até filmei o repórter de imagem. É um trabalho dividido, vamo-nos ajudando um ao outro. É evidente que o repórter de imagem tem essa responsabilidade, mas volta e meia eu também filmo. É um trabalho muito próximo, porque nós os dois também fazemos parte da história.

MC News: Como é que o Miguel escolhe as experiências? A partir de situações que já viveu?

Miguel Fernandes: Apesar de já ter feito muita coisa, curiosamente nunca tinha subido ao Pico ou estado numa gruta com aquelas características. A escolha tem a ver com a finalidade da reportagem, que é chegar ao maior número de pessoas possível. Não escolho as experiências pela radicalidade extrema, mas antes pela vontade de mostrar atividades que obriguem a esforço, a cansaço, que sejam arriscadas, que até possam causar medo, mas que potencialmente quase todas pessoas possam fazer. Na experiência de espeleologia estavam dois senhores de sessenta anos. Na subida do Pico eramos mais novos, mas há pessoas que sobem com mais idade.

MC News: De todos os episódios que já gravou qual foi o mais impactante?

Miguel Fernandes: Até agora, foi a subida do Pico. Foi a mais intensa e a que mais marcas me vai deixar.

MC News: Pela espiritualidade do que viveu?

Miguel Fernandes: Sim, sim. Quando falo dessa experiência ainda me arrepio muito. Foi muito cansativa, foi muito de ligação com as pessoas que lá estavam, foi muito física, mas, como digo na reportagem, só 20% foi físico, 80% foi alma, emoção e espiritualidade. O ponto alto foi o nascer do sol, em completo silêncio - o guia disse-nos que é muito, muito raro, ali haver ausência de vento. Houve uma mudança na natureza que nos permitiu usufruir o momento de outra maneira. A subida do Pico teve todos os ingredientes que procuro nas reportagens: deu para mostrar a subida, mostrar que ali os elementos mudam com facilidade, respeitámos a montanha, trabalhámos em grupo, sentimos várias emoções que fomos mostrando às pessoas.

MC News: A emoção, a magia, como refere num dos episódios, é essencial?

Miguel Fernandes: Quando pensei em fazer estas reportagens, tinha decidido que só fazia sentido fazê-las com uma linguagem diferente da que normalmente se usa e dando protagonismo ao narrador, expondo o jornalista, que é mais facilmente alvo de avaliações e críticas. Há quem defenda que o jornalismo tem de ser muito factual, muito frio. E eu não concordo, podemos ser emocionais e ser factuais na mesma. Não me afasto daquilo que é a minha missão de jornalista, que é informar. Até agora tem corrido muito, muito bem. Penso que é uma linguagem que aproxima as pessoas e a reação que tenho é que elas se sentem lá, a viver a experiência, e com confiança naquilo que está a ser passado. E isso dá-me especial prazer.