Para os jornalistas de política, as campanhas eleitorais são como a época de Natal. Há qualquer coisa de entusiasmante no largar da rotina das salas de reunião ou dos corredores alcatifados e passar duas semanas em digressão pelo país a ginasticar as técnicas de reportagem, os olhos e ouvidos atentos às frases que marcam e às gaffes que não se esquecem.

São duas semanas vividas numa bolha de jornalistas e políticos, onde invariavelmente se hipervaloriza pormenores noticiosos a que, muitas vezes, ninguém liga (a não ser os que lá estão dentro), mas onde também se tece o fio de uma narrativa capaz de marcar os destinos do país. É ali que se desenham líderes e se forjam derrotados, nesta longa estrada de milhares de quilómetros, quase sempre ao ar livre e por entre multidões animadas.

Tal como no Natal, parte da graça está na antecipação do que aí vem. Entra a pandemia na história e este Natal ficou estragado.

Com pouca rua, pouco povo e quase nenhum país, a festa arrefeceu e tem mostrado candidatos sem campanha, sem ideias, sem rasgo ou capacidade de surpresa. Pior: mostra candidatos que ou não estão verdadeiramente interessados nestas eleições, mas a fazer outros cálculos, ou estão sem ânimo para falar a um país assustado pelo vírus e que, ainda por cima, já decidiu quem quer ver em Belém.

É certo que um candidato a Presidente tem pouco a prometer, e também nesse sentido esta campanha é ingrata. Mas está em causa a escolha do Chefe de Estado de um país que continua mergulhado numa gravíssima crise sanitária e que se prepara para uma dolorosa crise económica e social.

Para já, aquilo que ficou da longa série de debates organizados pelas televisões pouco mais foi do que uma coleção de duelos, mais ou menos civilizados, de onde quase sempre saiu um vencedor, mas de onde quase nunca saiu uma ideia clara de país para os próximos cinco anos que fosse para além das amarras partidárias de cada um deles.

E o pouco que se tem visto nestes primeiros dias de campanha, não tem acrescentado valor. Uns planeavam não pôr os pés na rua e inventaram agenda cheia à última hora. Outros queriam ir a todo o lado e acabaram no quarto de hotel em isolamento profilático. Outros ainda repetem receitas antigas que acusam algum desgaste. Em comum, o facto de nenhum deles parecer ser capaz de fazer frente ao candidato Pai Natal - aquele de quem toda a gente fala, que é líder em popularidade, mas que não se deixará ver nesta campanha.

A viagem segue, por isso, pobre, limitada pelas circunstâncias, pela falta de imaginação e pelo desfecho previsível. Basta ver que o grande tema tem sido a possibilidade – não concretizada - de rever a Constituição para adiar as eleições e o receio de que o medo de votar em pandemia faça crescer ainda mais os já recordistas números da abstenção. Vindos da boca dos próprios candidatos, estes argumentos – perfeitamente legítimos - dão às Presidenciais 2021 o ar de um exercício supérfluo, um encolher de ombros, uma extravagância desnecessária em tempos de guerra.

Ainda assim, como é nosso dever, temos repórteres no terreno e estamos a ultimar os preparativos para a grande festa de dia 24 – porque a democracia é uma festa.

Mas temos de admitir que este não é o Natal que antecipávamos.