Viktoriya Starchenko sempre teve o sonho de trabalhar em comunicação e é agora uma das vozes da Rádio Comercial Ucrânia, apresentando o programa da manhã com Marcos Fernandes. Num momento muito duro a nível pessoal, afirma que esta rádio tem “o poder de ajudar, nem que seja com uma palavra, nem que seja com uma musiquinha”. A Rádio Comercial “fez uma coisa fantástica”.

MC News: Há quanto tempo está em Portugal?

Viktoriya Starchenko: Cheguei a Portugal com dezasseis anos, precisamente no dia 1 de agosto de 2005, ao bairro Senhora da Luz, perto das Caldas da Rainha. Já cá estavam os meus pais e eu e a minha irmã viemos depois, no percurso de uma normal família de imigrantes. Entrei para o 11.º ano e no início foi complicado, só queria estar com os meus amigos na Ucrânia, divertir me e aproveitar a vida.

MC News: Queria regressar à Ucrânia?

Viktoriya Starchenko: Sim, mas a minha integração facilitou-se quando percebi que a minha vida agora era em Portugal e era aqui que ia ficar, porque é um país que nos poderia dar um futuro melhor. Ainda por cima tive muita sorte na escola, a Escola Secundária Raul Proença, nas Caldas, com professores e amigos maravilhosos que me ajudaram e me acompanharam. Depois fui para a universidade, para Relações Internacionais – tive média de 16 e não entrei em Comunicação Social por duas décimas –, e três meses depois de acabar o curso consegui um trabalho na televisão, no programa “Nós” da RTP2.

MC News: O que fez nesse programa?

Viktoriya Starchenko: A equipa do “Nós” estava à procura de uma apresentadora de Leste, já com experiência. Calhou muito bem. Eu fazia uma rubrica chamada “Nós por aí” e andava, por aí, a descobrir Portugal, uma ucraniana a descobrir Portugal.

MC News: Agora está na Rádio Comercial Ucrânia, onde fala para a sua comunidade.

Viktoriya Starchenko: Sim, na altura falava sobre Portugal, agora falo para os ucranianos sobre o que acontece na Ucrânia. Trabalho com o Ireneu Teixeira, que faz os comentários sobre a guerra na Rádio Comercial Ucrânia, traduzo e transmito as notícias, tentando manter a linha dos comentários dele, para levar a informação ao povo ucraniano.

MC News: Não deve ser fácil.

Viktoriya Starchenko: Para mim, é o mais difícil. Chegar todos os dias, saber estas notícias que me afetam imenso, tentar manter a calma e transmiti-las. Ainda por cima, o objetivo da rádio é também fazer companhia e passar segurança, passar boa energia porque as pessoas chegam traumatizadas. Na minha família acolhemos oito familiares nossos, não são desconhecidos, e mesmo assim ainda estão a ultrapassar o choque. Por isso, estar na rádio e falar com um sorriso na cara é um grande desafio que faço questão de manter, não só por mim, mas por todos os que nos estão a ouvir. O Marcos Fernandes, coordenador da Rádio Comercial Ucrânia e com quem faço as manhãs da rádio, costuma dizer que se conseguirmos ajudar uma pessoa é a nossa vitória.

MC News: Sente-se a ajudar?

Viktoriya Starchenko: As nossas vidas mudaram no dia 24 de fevereiro. A minha mudou às 04h30 da manhã, com o telefonema do meu pai que tinha recebido uma fotografia da cidade de Kharkiv a ser bombardeada. No início pensei que estava a sonhar, que não podia estar a acontecer. A partir daquele dia não sabemos o que é dormir tranquilo. Não sabemos largar o telemóvel.  Há três semanas que não tenho contacto direto com a minha avó. Daí o trabalho na rádio ser muito importante e eu estou muito, muito grata por esta oportunidade. Eu sei que a minha voz para a comunidade ucraniana é importante e é importante ouvir a língua ucraniana na rádio portuguesa. O que a Rádio Comercial fez foi uma coisa fantástica.

MC News: Que reações tem tido?

Viktoriya Starchenko: O impacto que a rádio tem na comunidade: nos que chegam, nos que cá estão, mas também noutros países. Ucrânia, claro, Rússia, Austrália, Itália… tenho muitos amigos que vivem nesses países, que me deram os parabéns, mas, para além disso, ouvem a Rádio Comercial Ucrânia. Continuam a mandar mensagens a dizer que espalharam a notícia por tudo quanto é sítio. Entrei em contato com amigos na Ucrânia relacionados com a área musical e disse que íamos passar músicas de artistas ucranianos aqui na rádio. Adoraram a ideia e enviaram depoimentos de cantores ucranianos com mensagens positivas, de força. Também recebemos depoimentos de ucranianos que vivem cá, das mais diversas profissões – regra geral a dizerem que a integração em Portugal é possível. E ainda pequenas mensagens a agradecer a iniciativa, a pedir informações ou para divulgarmos ações de solidariedade. É uma onda que já incluiu muitas, muitas, muitas pessoas.

MC News: O seu trabalho na Rádio Comercial Ucrânia é o seu contributo para o esforço da guerra? É o seu contributo de resistência?

Viktoriya Starchenko: É mesmo, estou a sentir-me assim. No dia em que começou a guerra, e acho que muitos ucranianos que vivem aqui passaram por esta situação, foi o choque – choras, vês notícias. Nos dias seguintes também. Talvez no quarto ou quinto dia começas a acordar e pensar: o que posso fazer? Enviei e-mails para instituições, organizações de apoio a refugiados, liguei para antigos colegas e amigos da televisão: espalhem a mensagem que eu estou pronta para ajudar. Entretanto comecei a colaborar com a Associação I Help Ukraine e a sentir-me mais útil. E depois, claro, quando surgiu a oportunidade de fazer uma coisa tão gentil, tão boa, tão útil como a Rádio Comercial Ucrânia, senti-me um pouco aliviada deste peso de não poder fazer nada. Percebi que eu e o Marcos Fernandes, toda a Rádio Comercial, todo o grupo, temos o poder de ajudar, nem que seja com uma palavra, nem que seja com uma musiquinha. Este trabalho da Rádio Comercial Ucrânia, não é trabalho, é missão. As forças armadas ucranianas estão a lutar e a combater. Nós também temos a nossa luta, que é informativa, que é de companhia, que é de esperança. Não só para os Ucranianos, mas para os portugueses também.