Que todo o português gosta de opinar sobre futebol, já todos sabemos. É um jogo altamente democratizado que ao longo dos anos vem criando milhares de treinadores de bancada país afora. Acontece que agora o desporto rei tem concorrente: as séries de TV. Não há espetador assíduo que não se sinta especialista na matéria e hoje, em qualquer encontro de amigos, uma das perguntas obrigatórias é: que série estás a ver?

O que deixa claro que o género está mesmo para ficar. Mas em que moldes e em que suporte? É que as séries nacionais experimentadas recentemente em canal aberto não têm tido, genericamente, grande adesão de público o que nos leva à seguinte questão: só há espaço para séries no streaming? Se nos sentarmos num café, encontraremos várias teorias sobre o tema. Uns pensam que canais abertos produzem novelas e, como tal, nunca serão bons a produzir séries. Um preconceito que começa dentro de casa, quando ouvimos atores dizerem que uma série não pode ser palavrosa, porque isso é coisa de novela, e depois começamos a ver Ted Lasso ou Flea Bag, que são sucessos a toda a linha, e logo percebemos que dificilmente o texto poderia ser mais palavroso do que é (e que belos diálogos eles têm). Há também quem diga que novela é melodrama e que isso já não se usa, apesar da série Sucession ser o melhor melodrama do mundo.

Outros pensam que o que diferencia uma novela de uma série é a sua duração: uma novela é longa, a série é curta. Só que hoje existem novelas com 60 episódios apenas (no México por exemplo), tal como existem séries que terminaram com 121, como Lost, ou 61, como Breaking Bad. A grande diferença entre os dois géneros prende-se apenas com o fato da novela ter uma narrativa aberta (quando se começa a gravar não se sabe como a história vai terminar), ao passo que as séries não.

Com isto chego a Pecado, a nova mini-série da TVI, considerada a série portuguesa mais vista do ano até ao momento, que tem, também ela, sido alvo dos comentários de café. Uns acham que o seu sucesso passa por ter sido exibida num canal “popular”. Outros, por não passar de uma mini-novela, o que a fez cair no goto do público. Alguns acham que audiências nada têm a ver com qualidade, porque a trama está carregada de clichês.  E há quem sinta que a história tem coincidências a mais, apesar da vida real ser, ela mesma, cheia delas.

Eu digo que Pecado é uma série de TV, com um universo e narrativa bastante fechados, pensada para um público generalista de prime time. O que é que isto significa? Que em Pecado houve cuidado na escolha do tema central, que é polémico, mas q.b. (não escolhi falar da pedofilia na Igreja, por ex.), porque temáticas mais pesadas dirigidas a minorias podem existir no streaming, mas não em canal aberto como temática principal (o streaming vive da produção de conteúdos diversificados, que visam atrair novos públicos, já que o seu negócio são as assinaturas e não a publicidade); existiu também a intenção de incluir certos clichês que provocam no público de canal aberto a sensação de familiaridade com a história; o mesmo se vê em Quem Matou Sara? no streaming.

Pelo que a conclusão é que, tal como no cinema, não há apenas uma fórmula para fazer uma série de sucesso, nem há uma só maneira de contar histórias neste formato, tal como não há espaço para elas apenas no digital. Há sim que saber ajustar o conteúdo à plataforma onde ela vai ser exibida. E fazer um exercício honesto de escrita. Quando escrevo para TV não o faço para mostrar aos meus amigos o quanto posso ser culta ou interessante, ainda menos o faço para recolher elogios da crítica; escrevo, sim, o que acredito que pode trazer um bom resultado ao público e à estação.